O evangelho de Marcos revela a nova relação entre o povo e Deus, que se
estabelece através de Jesus. O que se vê é uma grande multidão de excluídos
(ochlós), seja dentre os gentios, seja da dispersão do judaísmo, que se reúne
em torno da casa onde se encontra Jesus. Esta multidão se diferencia do
"pequeno resto", estabelecido na sinagoga e no Templo, gozando de
privilégios e isolado da maioria do povo, considerada pecadora por infringir
qualquer um dos 613 mandamentos da Lei, tendo como protótipo Eva, que infringiu
a proibição do Criador (primeira leitura). Com Jesus temos uma nova realidade,
destacada pelos evangelhos ao mencionarem cento e quarenta e nove vezes a
"multidão" que se relaciona com Jesus. Esta relação é uma
característica muito mais marcante da índole e da personalidade de Jesus do que
as narrativas de seus milagres possam significar. É uma chave de leitura para
compreendermos a presença de Jesus no mundo, em relação com todos os povos e
culturas, não se limitando a grupos religiosos específicos.
O termo grego traduzido por "familiares" pode significar uma
proximidade consangüínea ou de amizade. Pode-se também interpretar que o verbo
usado no texto, "enlouqueceu", refira-se a Jesus ou à multidão.
Assim, pode-se entender que, ou os familiares ou os discípulos de Jesus, não o
compreendendo e julgando-o fora de si, queiram retê-lo, ou julgando a multidão
demais agitada queiram protegê-lo.
Os escribas vindos de Jerusalém são os enviados dos chefes religiosos que
tinham em mãos o culto sacrifical do Templo e o dinheiro do Tesouro, anexo ao
Templo. Eles se empenham em difamar Jesus, para afastar o povo dele. O Espírito
Santo é o amor.
Considerar as obras de amor do Espírito como sendo obras do demônio
significa o distanciamento e até a ruptura com o próprio amor de Deus. Rejeitar
e matar os que com amor buscam resgatar a dignidade humana dos empobrecidos
explorados e excluídos significa a rejeição da vida e do amor de Deus.
A partir de uma referência à sua família carnal, Jesus afirma: "Quem é
minha mãe? Quem são meus irmãos?... Quem faz a vontade de Deus, esse é meu
irmão, minha irmã e minha mãe". É a união em torno da prática da vontade
de Deus que cria os novos laços familiares no Reino. Viver o amor, o serviço, a
partilha, a misericórdia, solidariamente com os mais necessitados, é inserir-se
na família de Jesus, quer seja por laços consangüíneos, quer não, certos da
comunhão de vida eterna com Jesus (segunda leitura).
José Raimundo Oliva
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