sábado, 25 de outubro de 2014

O amor como fundamento da Lei.


A liturgia da palavra deste domingo é dominada pelo tema da Lei, enquanto expressão do cuidado de Deus para com toda a humanidade e do cuidado que cada um deve ter para com o seu semelhante. A Lei de Deus é dom oferecido como caminho para a vida, para a santidade e para a liberdade. A Lei foi dada por Deus ao seu povo para que ele preservasse o dom da vida e da liberdade; para que nunca mais o povo caísse na escravidão.
A pergunta do fariseu, doutor da Lei, acerca do primeiro dos mandamentos tem por finalidade pôr Jesus à prova, testar seu conhecimento e sua ortodoxia na interpretação da Lei. Mas não podemos descartar a hipótese de que os fariseus, ante a enorme quantidade de preceitos que deviam observar de modo irrepreensível (613 preceitos), já não soubessem mais, se é que um dia compreenderam, qual era o maior mandamento, ou seja, qual o mandamento que fundamenta todos os demais; qual era aquele mandamento que diante de um conflito entre dois deles nada pode substituí-lo ou ter precedência (cf. Lc 10,25-37). Na sua resposta, Jesus une de modo indissolúvel dois mandamentos: amor a Deus e amor ao próximo. O amor ao próximo é a conseqüência natural do verdadeiro amor a Deus. Esse dois mandamentos, considerados unitariamente, são o fundamento da Lei. Na origem da Lei de Deus, está o seu amor e a sua compaixão pelo ser humano que Ele criou. Em todos os demais mandamentos da Lei deve estar presente o mandamento do amor, inclusive como critério para observar ou não um determinado preceito. Quem cumpre o mandamento do amor cumpre plenamente a Lei e os profetas. O amor tira todo rancor e amargura; é o amor que dá sentido a tudo, que faz com que tudo tenha gosto; é o amor que nutre o desejo de viver. O amor a Deus e ao próximo se torna, em Jesus Cristo, um modo de viver. Somente amando podemos ser verdadeira e profundamente felizes e cristãos. O amor a Deus e ao próximo é uma força de vida que nos faz viver uma Páscoa permanente da saída do eu para a entrega generosa, gratuita, a Deus e ao próximo.

Carlos Alberto Contieri, sj

FONTE:

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sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Aquela que recebeu o favor de Deus.



O apreço pela Mãe de Deus entre os fiéis católicos é tal que ela assume os nomes dos lugares e situações em que a devoção tem origem (Fátima, Lourdes, Aparecida). A maternidade de Maria e o seu papel no desígnio salvífico de Deus só podem ser compreendidos à luz do mistério de Jesus Cristo. Maria é tida no evangelho segundo Lucas como aquela que recebeu o favor de Deus. Tal graça é a de gerar, segundo a carne, o Filho único de Deus (Lc 1,26-38).

Na releitura cristã de Ester para a festa de hoje, a súplica da rainha pela vida do seu povo (Est 7,3) é figura de Maria que se consagrou a Deus em favor do seu povo. Maria é para o cristão católico fiel intercessora. Mais ainda, ela é modelo do discípulo, pois é a mulher que escuta a palavra e a põe em prática.

Situado na parte do evangelho segundo João denominada “livro dos sinais” (Jo 1–11), o relato das bodas de Caná é considerado pelo próprio evangelista o “primeiro dos sinais” (v. 11), numa série de sete sinais. Dizer que se trata do primeiro sinal significa que ele é um sinal fundamental para compreender os demais. É preciso sempre ter presente que o evangelho é fruto da experiência pascal dos discípulos. No centro do relato está a pessoa de Jesus que inaugura os tempos messiânicos. Característica do relato das bodas de Caná é que se trata de uma narração simbólica e que, por isso, exige do leitor o esforço de ultrapassar a materialidade do que é narrativamente descrito e do imediatamente dito. As bodas evocam a Aliança de Deus com o seu povo (cf. Os 2,18-21; Ez 16,8; Is 62,3-5). Aliança passada e reiterada ao longo da história decorrida de Israel (Noé, Abraão, Moisés) e Aliança nova e definitiva em Jesus Cristo (cf. Mc 14,22-25; Mt 26,26-29; Lc 22,19-20). O vinho, símbolo da alegria e da prosperidade (Sl 104,15; Jz 9,13; Eclo 31,27-28; Zc 10,7), oferecido por Jesus é melhor do que o primeiro (cf. v. 10). Isto significa que, em Jesus Cristo, a Aliança atingiu a sua plenitude. A mãe de Jesus (vv. 1.3), que ele mesmo no relato designa de “mulher” (v. 4) é símbolo de Israel que espera, confia, suplica e vê realizada a promessa de salvação feita por Deus a seu povo. Na tradição cristã, a Mãe do Senhor é ícone da Igreja.


Carlos Alberto Contieri, sj

FONTE: http://www.paulinas.org.br/diafeliz/?system=evangelho
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sábado, 4 de outubro de 2014

História do amor de Deus.


A liturgia da palavra deste vigésimo sétimo domingo do Tempo Comum trata de dois aspectos paradoxais: de um lado, o cuidado e proteção de Deus a seu povo e, de outro, a infidelidade do povo a esse imenso amor de Deus. No centro do texto do profeta Isaías, encontramos esta pergunta comovente de Deus: “O que mais eu devia fazer por minha vinha que eu não tenha feito?” (v. 4). No trecho de Isaías como no de Mateus, encontramos duas parábolas da vinha. A parábola presente no primeiro evangelho é inspirada pela parábola do capítulo quinto de Isaías. Nos quase oito séculos que separam um texto do outro, a situação praticamente não mudou: Deus continua fiel e amando o seu povo, mas o povo continua afundando na areia movediça da ingratidão e da infidelidade.

Ao ler esse trecho de Isaías, tem-se a impressão de que o autor faz uma releitura da criação e do pecado da humanidade (Gn 1–3). Deus plantou uma vinha para que ela pudesse dar frutos. Deus criou a humanidade e elegeu o seu povo para que pudesse viver no seu amor e corresponder a ele por uma vida santa. Mas isso não aconteceu; o fruto não foi o esperado. Muitos dentre os membros do povo de Deus perverteram a justiça e se deixaram seduzir pelo mal (cf. Is 5,20).

O evangelho de hoje também é, através da linguagem própria à parábola, história do amor de Deus. Mas a menção da rejeição e morte do filho do dono da vinha dá à parábola um alcance cristológico. No Antigo Testamento, a vinha é símbolo do povo de Deus (cf. Is 5,7), povo que Deus criou e escolheu e que Ele cuida com amor, como vimos na leitura de Isaías. Entre os membros do povo de Deus, há aqueles que Deus escolheu para, em seu nome, cuidarem e protegerem o povo que a Deus pertence. Nossa parábola denuncia, em primeiro lugar, aqueles que, ao invés de cuidarem do povo, querem se apossar da vinha do Senhor. Para isso, rejeitaram todos os que foram enviados por Deus para alertá-los e exortá-los à fidelidade. Trata-se de uma menção ao fim trágico de muitos profetas. Em segundo lugar, e essa é a intenção mais importante da parábola, ele faz o leitor compreender que a morte de Jesus foi premeditada e é fruto da ganância, da maldade deliberada dos chefes do povo (cf. vv. 38-39). Apesar do v. 42, a parábola não possui um juízo condenatório; ela é, isso sim, um forte apelo a reconhecer em Jesus o dom de Deus, a viver em conformidade com esse dom e, nele, produzir bons frutos.


Carlos Alberto Contieri, sj

FONTE: http://www.paulinas.org.br/diafeliz/?system=evangelho
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