sábado, 28 de julho de 2012

Novo mandamento de Jesus, a partilha



No evangelho de João, na narrativa da última ceia de Jesus em Jerusalém, não há menção à partilha eucarística do pão. A grande ação de Jesus nesta ceia é o lavar os pés dos discípulos, como exemplo de serviço para eles. Este gesto de partilha se realiza neste momento de encontro com a grande multidão no alto da montanha e tem um caráter universalista, pois aí estavam presentes gentios da Galileia e de territórios vizinhos.

Foi no alto de uma montanha que Deus deu os dez mandamentos a Moisés. Agora é o novo mandamento de Jesus, mandamento da partilha, do amor. O personagem central é um menino (paidárion, jovem escravo), com cinco pães de cevada e dois peixes. Jesus dá graças (eukharistésas) pela partilha, e ela acontece a partir dos mais humildes. Somos convidados a viver a eucaristia como partilha concreta do pão e da vida.

Nesta narrativa é destacada, logo de início, a grande multidão de excluídos que segue Jesus e que merece sua atenção. Vemos aí, também, uma contraposição entre este encontro de Jesus com a multidão e "a Páscoa, a festa dos Judeus". Nesta Páscoa celebrava-se a morte dos egípcios, que eram oprimidos pelo faraó, e a saída do povo de Israel do Egito para a invasão e o extermínio dos povos de Canaã. Em oposição a esta celebração da violência, Jesus revela o Deus da vida e do amor. Sempre no meio da multidão, Jesus comunica a vida.

A expressão "festa dos judeus" aparece cinco vezes no evangelho de João, ao referir-se às festas religiosas celebradas em Jerusalém, nas quais Jesus se fez presente. Com esta expressão João quer indicar que Jesus não se identifica com estas festas, mas vai a Jerusalém para criticar o sistema do Templo e para fazer seu anúncio da vontade do Pai ao povo que para aí acorre. Agora, no alto da montanha, o povo participa da verdadeira festa que é o banquete do Reino, caracterizado pela partilha, pelo amor e pela fraternidade.

O evangelho de João apresenta sete sinais de Jesus, que correspondem aos milagres, nos sinóticos. São sinais da realidade maior que é a presença do Deus de amor no mundo e na história. Esta cena da partilha dos pães é o quarto sinal.

Os três evangelhos sinóticos, Marcos, Mateus e Lucas, também narram esta partilha dos pães. Suas narrativas foram colhidas da tradição das primeiras comunidades cristãs que se inspiravam na narrativa da partilha do pão feita pelo profeta Eliseu (primeira leitura).

A solução do problema da fome e das carências humanas não está na economia de mercado, no vender e no comprar em vista do lucro. É pela partilha dos bens deste mundo, do pão, da terra, da cultura, que se pode satisfazer a todos e ainda há de sobrar em abundância. É pela partilha que se chega à unidade desejada por Deus, superando-se a divisão entre ricos e pobres, formando-se um só corpo e um só Espírito, no vínculo da Paz (segunda leitura).

José Raimundo Oliva


sábado, 21 de julho de 2012

Compaixão de Jesus por seu povo




Temos neste texto do evangelho de Marcos mais um sumário da missão de Jesus, que fecha a narrativa do retorno dos apóstolos que haviam sido enviados em missão (cf. 15 jul.) e revela a intensa atividade de Jesus com os apóstolos, em seu ministério.

Os apóstolos, ao retornarem, contam tudo o que tinham feito e ensinado, identificados com a prática de Jesus. Na missão o ensino é acompanhado da ação libertadora e vivificante. Não há notícias detalhadas sobre o desenvolvimento desta missão, pois os evangelhos concentram-se na pessoa de Jesus, em seus atos e em seus ensinamentos.

Sendo solicitados pela multidão que chegava e saía, Jesus se preocupa com o repouso dos apóstolos. É necessário um tempo para "descansar" e "comer". É uma alusão ao recolhimento para a oração e o alimentar-se da palavra de Jesus. Ele, com seus discípulos, deslocam-se, então, de barco para um lugar deserto. Marcos, em estilo bem impressivo, narra que muitos que viram Jesus partir, e outros mais que se juntaram a estes, se antecipam, a pé, chegando antes de Jesus e seus discípulos, na margem onde desembarcaram. Encontrando a multidão carente que nele busca um sentido para a sua vida, Jesus enche-se de compaixão por ela.

Para indicar a multidão, Marcos usa uma palavra (ochlós) que designa o grande número de excluídos e marginalizados, uma confusa maioria de pessoas anônimas que se diferenciam da classe dirigente. Eram pessoas prejudicadas pelo sistema político-religioso, tanto do império romano como do Templo de Jerusalém, que agiam como "governantes e pastores que destroem e dispersam o rebanho da minha pastagem!", em um contexto bem semelhante ao vivido pelo profeta Jeremias (primeira leitura), que denunciava a injustiça e a opressão em seu tempo e colocava a esperança de Judá em um messias que reinaria com justiça. Estas pessoas empobrecidas, excluídas das sinagogas e das elites sociais, buscam acolhida em Jesus. Marcos, de maneira muito característica de seu estilo, destaca o sentimento de compaixão de Jesus pela multidão, realçando sua condição humana e seu amor divino.

Jesus é o bom pastor que acolhe as multidões, sem discriminar ninguém, unindo a todos na paz que é fruto do amor (segunda leitura). Ele se põe a ensinar. O ensino de Jesus, a ser comunicado na missão, não é um simples acúmulo de saber. É a revelação da face de Deus e de sua presença amorosa entre os pobres e excluídos, descartando a busca ambiciosa de dinheiro e de poder.

A palavra amorosa Jesus, dirigida aos excluídos e marginalizados, traz-lhes esperança e ânimo. Suas palavras não são princípios de uma doutrina, mas são uma comunicação de vida e amor. Sua prática é acompanhar suas palavras com gestos de libertação e dom da vida.

O ponto alto de seu ensinamento, destacado neste episódio, é a educação para a partilha, que será narrada em seguida.


José Raimundo Oliva



Fonte: http://www.paulinas.org.br/diafeliz/evangelho.aspx

domingo, 8 de julho de 2012

Jesus de Nazaré, o Filho de Deus



O evangelista Marcos narra que Jesus foi para “Sua própria terra”, isto é, para Sua cidade de origem, a cidade de Sua família: Nazaré. Para Marcos, esta é a última vez que Ele àquele lugar. É também a última vez que Ele entra numa sinagoga, lugar onde os judeus se reuniam aos sábados para ouvir a Palavra de Deus e rezar. No início, quem se admira são os ouvintes. Porém, a admiração não os leva à fé em Jesus, mas sim a rejeitá-lo. No final desse Evangelho, é Jesus quem se admira com a falta de fé daquele povo. Essa falta de fé no Homem-Jesus impede a realização de milagres, isto é, o Reino acaba não acontecendo em Nazaré.

Marcos dá a entender que o povo estava cansado com esse costume. De fato, quando o Senhor entra, pela primeira vez, numa sinagoga e começa a ensinar (cf. 1,21-28), o povo gosta desse novo ensinamento dado com autoridade (cf. 1,27).

Em Nazaré, terra de Jesus, as coisas tomaram um rumo diferente. É que Ele não havia frequentado nenhuma escola de ensino das Escrituras, não fez nenhuma especialização. Além disso, Seu ensinamento é acompanhado de uma prática que livra as pessoas de qualquer tipo de opressão. Marcos não consegue mostrá-Lo ensinando sem que antes Ele desse a verdadeira liberdade ao homem. Mais ainda: Seu ensinamento é uma prática de autêntica liberdade.

Em Nazaré, num dia de sábado, Jesus está ensinando na sinagoga. Mais uma vez o evangelista não diz o que Jesus ensina. Nós não precisamos de explicações, pois conhecemos que tipo de ensinamento é o d’Ele.

O povo que está na sinagoga manifesta sua perplexidade e descrédito em relação a Jesus. A primeira e a segunda levantam suspeita e ceticismo: “De onde ele recebeu tudo isto? Como conseguiu tanta sabedoria?” Por trás dessas objeções está o início da rejeição de Jesus como Messias. Naquele tempo, especulavam muito sobre a origem do Messias. E a conclusão a que chegaram era esta: “Nós sabemos de onde vem esse Jesus, mas, quando chegar o Messias, ninguém saberá de onde ele vem” (Jo 7,27). Jesus, portanto, não poderia ser o Messias, pois sua origem era conhecida por todos. Além disso, para os conterrâneos de Cristo é impossível “fazer teologia” sem passar pela escola dos doutores da Lei e fariseus.

A terceira pergunta levanta suspeitas sobre quem age por meio de Jesus: “E esses grandes milagres que são realizados por suas mãos?” Um pouco antes, alguns doutores da Lei afirmavam que o chefe dos demônios agia em Jesus, levando-O a expulsar demônios. O povo de Nazaré deixa transparecer essa mentalidade.

A última pergunta sintetiza todas as anteriores: “Esse homem não é o carpinteiro, o filho de Maria e irmão de Tiago, de José, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?” É uma pergunta desmoralizante e debochada. Quando se queria desprezar alguém, bastava substituir o nome do pai pelo da mãe. Por isso, a expressão “filho de Maria” (a não ser que José já tivesse morrido) é altamente depreciativa. E a conclusão é muito simples: “Ficaram escandalizados por causa dele”, isto é, seus conterrâneos O rejeitaram.

Jesus, portanto, foi rejeitado, porque se apresentou como um trabalhador que cresceu em Nazaré ao lado de parentes, amigos e conhecidos. Seus conterrâneos não descobriram n’Ele nada de extraordinário que pudesse indicá-Lo como o Messias de Deus, mas a extraordinariedade de Jesus-Messias está justamente aí, na Encarnação, no fato de não ter nada que possa diferir da condição humana comum. O Filho de Deus se fez como qualquer um de nós, e aqui está o “nó da questão”. Muitos afirmam que “não creem, porque não veem”. Os conterrâneos de Jesus não creem, justamente porque veem Jesus trabalhador, o filho de Maria, um homem do povo, que não frequentou nenhuma escola superior, um homem que vem de Nazaré, lugarejo insignificante.

O “escândalo” da Encarnação continua sendo um espinho atravessado na garganta de muito cristão de boa vontade. Por se encarnar nas realidades humanas, Jesus-Messias foi rejeitado. Isso faz pensar no desafio que é a encarnação do Evangelho na realidade do povo. Ficaremos paralisados como os conterrâneos de Jesus?

Pai, abra minha mente e meu coração para eu compreender que o Senhor se serve de meios humanamente modestos para realizar as suas maravilhas.

Padre Bantu Mendonça

Fonte: http://blog.cancaonova.com/homilia/2012/07/08/jesus-de-nazare-o-filho-de-deus/


domingo, 1 de julho de 2012

Onde está Pedro, aí está a Igreja!



Estamos diante da questão da identidade de Jesus. Perante isto, dois títulos se confrontam: “Filho do Homem” e “Cristo”. Jesus, com frequência, identifica-se como o “Filho do Homem”. Por outro lado, os discípulos originários do Judaísmo identificam-no como o “Cristo”. O “Filho do Homem” é uma expressão que aparece quase uma centena de vezes no livro do profeta Ezequiel, exprimindo a condição humana comum e frágil de alguém que coloca toda sua confiança em Deus.

“Cristo”, sinônimo de “Messias” ou “Ungido”, é um título aplicado, abundantemente, a Davi, ou a um de seus descendentes, no Antigo Testamento, estando associado à ideia de um chefe poderoso e dominador.

“Por isso eu te digo que tu és Pedro, e sobre esta pedra construirei a minha Igreja, e o poder do inferno nunca poderá vencê-la” (Mt 16,18). A Igreja é imortal e seu fundamento deve perdurar sempre.

Nós católicos temos a certeza e o orgulho de sermos a única Igreja cristã edificada sobre o fundamento rochoso, sobre Pedro (ver Mt 7,24). Daí que nós, simples e humildemente, nos orgulhamos em afirmar: “Onde está Pedro, aí está a Igreja!”

Deixemos a primeira pergunta: “Quem dizem os homens que eu sou?”. Respondamos a segunda pergunta: “E vós?”. Hoje, não é suficiente a resposta de Pedro: “O Messias, o esperado de Israel”. A nossa deveria ser: “O Filho de Deus encarnado, ‘que se entregou e morreu por nós’” (cf. Gl 2,20). Por isso, vivemos a vida presente pela fé no Filho de Deus.

Na verdade, essa imagem de Cristo, que levamos dentro de nós desde o batismo, está destroçada ou escurecida. Como poderemos ser apóstolos se não sentimos Sua presença dentro de nós? Como “vender um produto” do qual não estamos, nós mesmos, convencidos?

A resposta de Jesus, dada a Simão, indica que a nossa resposta, admitindo Seu senhorio total como Messias e Filho de Deus, é também um dom do céu. Não seremos os chefes, como Pedro, mas a Igreja estará fundada em nós e nas nossas famílias.

Além de Cristo, como figura central, temos Pedro como figura destacada por duas razões: por sua fé em Jesus e por sua lista de serviços como chefe da comunidade. A revelação de confessar Jesus como Messias, Filho de Deus, é um dom do Pai, e isso serve para todos nós.

A chefia da comunidade eclesial é própria dele [Pedro] e continua em seus sucessores através dos séculos. A eles pertence o poder das chaves, jurídico e doutrinal, como o entende a Igreja Católica. Não foi dado este poder aos outros discípulos e, portanto, devemos distingui-lo do poder evangelizador e de governo dado ao resto dos apóstolos, do qual todos nós participamos como discípulos e missionários de Jesus Cristo com uma missão específica.

Que os dois pilares da Igreja, Pedro e Paulo, intercedam por cada um de nós a fim de que sejamos verdadeiramente discípulos e missionários, exercendo as nossas tarefas diárias e professando a nossa fé em Jesus Cristo, o Filho do Deus Vivo!

Padre Bantu Mendonça

Fonte: http://blog.cancaonova.com/homilia/2012/07/01/onde-esta-pedro-ai-esta-a-igreja-2/