segunda-feira, 11 de junho de 2012

Familiares no Reino fazem a vontade de Deus



O evangelho de Marcos revela a nova relação entre o povo e Deus, que se estabelece através de Jesus. O que se vê é uma grande multidão de excluídos (ochlós), seja dentre os gentios, seja da dispersão do judaísmo, que se reúne em torno da casa onde se encontra Jesus. Esta multidão se diferencia do "pequeno resto", estabelecido na sinagoga e no Templo, gozando de privilégios e isolado da maioria do povo, considerada pecadora por infringir qualquer um dos 613 mandamentos da Lei, tendo como protótipo Eva, que infringiu a proibição do Criador (primeira leitura). Com Jesus temos uma nova realidade, destacada pelos evangelhos ao mencionarem cento e quarenta e nove vezes a "multidão" que se relaciona com Jesus. Esta relação é uma característica muito mais marcante da índole e da personalidade de Jesus do que as narrativas de seus milagres possam significar. É uma chave de leitura para compreendermos a presença de Jesus no mundo, em relação com todos os povos e culturas, não se limitando a grupos religiosos específicos.

O termo grego traduzido por "familiares" pode significar uma proximidade consangüínea ou de amizade. Pode-se também interpretar que o verbo usado no texto, "enlouqueceu", refira-se a Jesus ou à multidão. Assim, pode-se entender que, ou os familiares ou os discípulos de Jesus, não o compreendendo e julgando-o fora de si, queiram retê-lo, ou julgando a multidão demais agitada queiram protegê-lo.

Os escribas vindos de Jerusalém são os enviados dos chefes religiosos que tinham em mãos o culto sacrifical do Templo e o dinheiro do Tesouro, anexo ao Templo. Eles se empenham em difamar Jesus, para afastar o povo dele. O Espírito Santo é o amor.

Considerar as obras de amor do Espírito como sendo obras do demônio significa o distanciamento e até a ruptura com o próprio amor de Deus. Rejeitar e matar os que com amor buscam resgatar a dignidade humana dos empobrecidos explorados e excluídos significa a rejeição da vida e do amor de Deus.

A partir de uma referência à sua família carnal, Jesus afirma: "Quem é minha mãe? Quem são meus irmãos?... Quem faz a vontade de Deus, esse é meu irmão, minha irmã e minha mãe". É a união em torno da prática da vontade de Deus que cria os novos laços familiares no Reino. Viver o amor, o serviço, a partilha, a misericórdia, solidariamente com os mais necessitados, é inserir-se na família de Jesus, quer seja por laços consangüíneos, quer não, certos da comunhão de vida eterna com Jesus (segunda leitura).

José Raimundo Oliva


sábado, 2 de junho de 2012

Missão dos discípulos de Jesus



Nos evangelhos de Marcos e de Mateus, quando as mulheres, após a crucifixão de Jesus, vão visitar seu túmulo na madrugada do primeiro dia da semana, um anjo lhes diz: "Ide contar aos discípulos que ele ressuscitou dos mortos e que vos precede na Galileia. Lá o vereis" (Mc 16,7; Mt 28,7). No evangelho de Marcos, Jesus já havia dito aos discípulos: "Depois que eu ressurgir, eu vos precederei na Galileia" (Mc 14,28).

Em Mateus, após as palavras do anjo, o próprio Jesus, vindo ao encontro das mulheres, lhes repete: "Ide anunciar a meus irmãos que se dirijam para a Galileia; lá me verão" (Mt 28,10).

Em continuidade a este anúncio, Mateus registra o encontro dos discípulos com Jesus em uma montanha da Galileia. Durante seu ministério na Galileia, Jesus já havia enviado os apóstolos em missão. Agora, permanecendo vivo entre eles, reenvia-os para fazer discípulos entre todas as nações. Não há nenhuma eleição particular, todos são chamados ao seguimento de Jesus, na adesão à vontade do Pai, que é que todos tenham vida, em comunhão plena de amor.


Os discípulos são enviados para batizar, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Jesus assumiu o batismo de João revelando que este batismo da conversão é do agrado de Deus, e pela prática da justiça que promove a vida, removendo o pecado do mundo, somos inseridos na própria vida divina, na comunhão de amor entre o Pai e o Filho. Deixando-nos conduzir pelo Espírito de Amor, na fraternidade e na compaixão, tornamo-nos filhos de Deus (segunda leitura), ao qual chamamos de "Pai Nosso".
 
Em contraste com os evangelhos de Marcos e Mateus, Lucas não narra o retorno à Galiléia. Na sua narrativa, com sua teologia particular, o ressuscitado ordena aos discípulos: "Permanecei em Jerusalém até serdes revestido da força do Alto" (Lc 24,49). E Lucas conclui seu evangelho com a observação: "Eles voltarem a Jerusalém com grande alegria e estavam continuamente no Templo, louvando a Deus" (Lc 24,52s). O empenho de Lucas é apresentar Jerusalém como sendo o centro de irradiação do cristianismo, após a morte de Jesus, relegando a Galileia à obscuridade.


Credo da tradição de Israel, bem desenvolvido no livro do Deuteronômio (primeira leitura), se fundamenta em uma divindade que elege um povo e o conduz à "terra prometida", por meio de "sinais e prodígios, por meio de combates, com mão forte e braço estendido, por meio de grandes terrores", exterminando os demais povos, que são considerados inimigos. É o deus do terror: "Hoje começarei a espalhar o terror e o medo de ti aos povos debaixo do céu. Ao ouvirem falar de ti, ficarão perturbados e tremerão de angústia à tua frente" (Dt 2,25). Esta crença, como foi destacado pelo Sínodo para o Oriente Médio, em 2010, tem sido o fundamento das violências perpetradas contra o povo da Palestina, em nossos dias. Removendo esta imagem de Deus, Jesus vem revelar o Deus de amor e misericórdia, na humildade, na mansidão e na paz, que acolhe todos os povos do mundo. Jesus se comunica não com terror e poder, mas com seu amor e suas palavras dirigidas aos seus discípulos, de irmão para irmão, de amigo para amigo. É a presença carinhosa, com palavras de vida que seduzem e conquistam.

José Raimundo Oliva