sábado, 3 de agosto de 2013

A falta de diálogo



Muitas vezes, e com relativa frequência, o editor da Bíblia vernácula atribui títulos às perícopes, ou unidades literárias, que não só não ajudam como induzem o leitor a erro de interpretação. É bem o caso do trecho do evangelho deste domingo.

Geralmente, esta parábola tem sido intitulada “Parábola do rico insensato”. A palavra “insensato” só aparece no v. 20; ademais, seria empobrecer a mensagem da parábola pensar que o problema do personagem consiste unicamente na acumulação de bens e numa maneira de possuir mais, totalmente estranha à fé em Deus. A parábola tem alcance muito maior. O verbo “dizer” é repetido várias vezes (vv. 17.18.19), num monólogo do personagem único, solitário e sem próximo. Esta observação, e se é necessário, pode nos levar a intitular a parábola deste modo: “O esquecimento fatal do diálogo”.

Esquecimento do diálogo com Deus, no que concerne ao rico proprietário (vv. 16ss), e do diálogo entre os dois irmãos acerca da partilha dos bens (vv. 13-14). O v. 15 faz a transição entre o pedido de arbitragem de um dos irmãos e a parábola.

A palavra traduzida por “ganância”, no v. 15, em grego exprime uma vontade de ter superioridade, um desejo de poder: “... pois mesmo que se tenha muitas coisas, a vida não consiste na abundância de bens” (v. 15). Isto significa que a riqueza não impede a morte inesperada. A abundância, o ter, pode substituir Deus. Ao invés de nos fazer disponíveis, essa facilidade ou abundância é em que nós confiamos, de fato. Isto é uma ilusão: eu creio possuir, mas, de fato, eu sou possuído! O importante é a nossa maneira de possuir, isto é, o papel que tem no nosso ser profundo o que nós possuímos.

Resumidamente, a parábola nos faz perguntar: Você é por ou contra Deus? É esta a questão posta ao rico: “E para quem ficará o que acumulaste?” (v. 20). Cabe a nós, diante do Senhor, respondermos também a isto: O que é que me enriquece de bens que não se contabilizam, mas modelam meu rosto, num olhar sobre o mundo, sobre os outros e sobre mim mesmo?


Carlos Alberto Contieri, sj

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